No caminho, tudo azul, com a inversão outonal aprisionando a névoa seca que sujava de marrom a camada mais baixa. Ao menos o sol estava quente e, ao chegarmos em Nova por volta de meio-dia, levíssimas formações, ainda esfiapadas, ameaçavam aparecer acima da Serra do Vulcão.
Na última vez que eu tinha voado em Nova, tinha subido a estrada em meu carro, sem maiores problemas. Dessa vez eu sabia que a estrada estaria pior, mas não imaginava que estivesse tão ruim assim! Pode listar aí: Mitsubishi Pajero, L200, Toyota Hilux, Land Rover, esses carrinhos de luxo podem até completar o Paris-Dakar, mas para chegar ao topo da Serra naquela estrada não dão nem para saída. É sério, carro valente de verdade são essas gaiolinhas! Quando eu vi o jeito daquele buggy depenado e barulhento, desconfiei, mas até achei que daria para subir a serra. Quando carregaram quatro asas, quatro cintos, e mais seis cabeças em cima daquela máquina singular, eu desanimei um pouco, ainda assim, otimista, pensei que se não estivesse tão ruim a subida, talvez até desse para chegar na rampa.
Já quando eu vi a situação do começo da estrada, tive certeza de que não chegaríamos... Só que rapidamente essa preocupação de não chegar passou a dar lugar à outra preocupação mais premente: sobreviver à subida!
Subidas íngremes, secas, esburacadas, pedregosas, tínhamos que saltar do carro para subir alguns trechos impossíveis. O exímio Carlinhos fazia milagres na pilotagem e o carrinho ia subindo! Inacreditável! Vez ou outra a gaiolinha não aguentava e morria. "Bota o calço, bota o calço!" instruía o Carlinhos, e tome pedroco debaixo do pneu, para evitar que a caranga deslizasse para o barranco e também para depois fornecer um apoio inicial para a retomada.
Três passageiros do lado de dentro e três meio dentro e meio fora. É difícil saber quem sofre mais, se são os passageiros do lado de fora, que vão levando lama na cara e sendo arranhados por galhos nas costas, e ainda por cima têm que saltar quando o motor sobrecarrega; ou se são os passageiros do lado de dentro, que suam frio torcendo para que a gaiola não caia fora da estrada com eles dentro.
Cheguei a comentar que a suspensão era macia, e até era mesmo, mas numa manobra mais brusca um dos passageiros deu uma cabeçada tão forte no Santo Antônio que quase acabou sendo a primeira baixa do grupo. O Carlinhos comentava que a piot parte ainda estava à frente, eu achei que ele estava só brincando, mas era verdade pois, depois do trecho seco, veio o tal "sabão", trechos escorregadios que reservavam novas emoções e alguns banhos de lama. Estrada estreita, barranco altíssimo do lado direito, a galera que vai do lado de fora fica quase com o corpo pendurado no abismo. A galera do lado de dentro reza escondido para o carro não parrar na subida e nem patinar em direção ao barranco, afinal viemos aqui para voar com as asas montadas... Nessa hora a vontade que dá é de ir mesmo andando a pé do lado de fora.
Chegando à rampa, com os cumprimentos ao nosso condutor de gaiola, a condição estava melhor do que parecia, as formações começavam a tomar corpo e alguns urubus rodavam na cara da rampa.
Montei a jato. Estou ficando bom nisso. Em 20 minutos asa montada com o cinto enganchado nela, com radio, agua, celulares, enfim, tudo em cima. Uma asa com king decolou e ganhou com certa facilidade, oba pelo menos vai dar um vôozinho!
Olha, não é por nada não, deixando de lado minha modéstia vou declarar que minha asa sempre é a mais linda da rampa! Esse tecido fumê com o amarelo e laranja por baixo e a gaivotinha da Moyes branca projetando sua sombra no pano de baixo realmente são demais!
Ênio decolou à minha frente e pegou lá fora, à direita, decolei em seguida, com um auxílio cabo na asa esquerda, e fui perdendo forte até entrar nessa mesma termal do Ênio e rapidamente deixar a rampa lá embaixo e ir tomar um pouco de ar fresco lá no alto. Entre uma e outra térmica, fui chegando até 1.350 mts o que equivaleria praticamente à base da nuvem, só que raramente havia nuvem para se estar na base. As formações derivavam velozmente para trás da rampa e logo dissipavam. Ficamos ali uns bons 20 minutos, todo mundo ficando alto mas ninguém indo pra lugar nenhum, porque de fato não parecia haver lugar bom para ir. Como só eu estava de rádio, não dava para coordenar uma navegação com os outros.
Pouso legal de Sul, num pasto enorme! Olha a asinha aí de novo, com um piloto satisfeito!
Tá bom o tamanho desse pouso? E com direito a um belo pôr-do-sol, onde raios crepusculares filtravam-se em meio a uma camada de cirrostratus.
Os dados deste vôo estão no seguinte link:
http://www.xcbrasil.org/modules.php?name=leonardo&op=show_flight&flightID=7882